(Goiânia/GO) - Imagine enxergar o mundo como se uma lente borrada estivesse à sua frente o tempo todo. Essa é a realidade de quem convive com o ceratocone, uma doença que afina e deforma a córnea, comprometendo a visão e, em casos mais graves, podendo levar à cegueira.
O problema costuma aparecer entre os 10 e 25 anos de idade e evolui de forma lenta. Os sintomas variam, mas geralmente envolvem visão borrada, distorção de imagens, sensibilidade à luz e dificuldade para enxergar à noite. Muitos pacientes relatam que precisam trocar o grau dos óculos com frequência até que as lentes deixam de corrigir a visão.
Hoje, estima-se que o ceratocone afete cerca de 150 mil brasileiros por ano, e entre 50 e 200 pessoas em cada 100 mil no mundo. O diagnóstico precoce é o melhor caminho para preservar a visão e garantir qualidade de vida.
Por ser uma condição genética e hereditária, não há como prevenir o surgimento do ceratocone, mas é possível evitar sua progressão. O principal cuidado é não coçar os olhos e tratar alergias que causem coceira, como rinite e asma. Consultas regulares ao oftalmologista são essenciais para detectar a doença ainda no início.
Embora não tenha cura, o ceratocone pode ser controlado. Em fases leves, o uso de óculos ou lentes especiais ajuda a corrigir a deformidade. Em casos mais avançados, há tratamentos como o implante de anéis intracorneanos (anéis de Ferrara) e o crosslinking, um procedimento que fortalece o tecido da córnea e impede que ela continue se deformando. O transplante de córnea é indicado apenas em situações mais graves.
Mas, no Dia Mundial do Ceratocone, celebrado em 10 de novembro, o médico oftalmologista Fernando Heitor de Paula (foto), da equipe do Instituto Panamericano da Visão e com 20 anos de experiência em ceratocone, ressalta que a doença deixou de ser uma sentença de perda visual.
Segundo ele, com diagnóstico precoce e tratamentos modernos como o crosslinking e os anéis intracorneanos, é possível preservar a visão e a qualidade de vida da imensa maioria dos pacientes. “A informação e o acompanhamento regular são nossas melhores armas para enxergar o futuro com clareza.”
Confira mais informações na entrevista do especialista:
O que é e quais são os sintomas mais comuns do ceratocone?
O ceratocone é uma doença não inflamatória e progressiva da córnea, a estrutura transparente que recobre a parte anterior do olho. Com o tempo, ela vai se tornando mais fina e adquire um formato de cone, o que distorce a passagem da luz e compromete a visão. Nos estágios iniciais, o paciente pode confundir os sintomas com uma simples miopia ou astigmatismo. Entretanto, há sinais de alerta que merecem atenção:
• Embaçamento visual progressivo e dificuldade para enxergar com nitidez, mesmo com óculos atualizados.
• Trocas frequentes de grau, especialmente de astigmatismo.
• Sensibilidade à luz (fotofobia) e visão duplicada ou distorcida.
• Halos e reflexos ao redor das luzes à noite.
• Em fases mais avançadas, afinamento e irregularidade visível da córnea, podendo causar cicatrizes e perda importante da acuidade visual.
O ceratocone geralmente se manifesta na adolescência e pode progredir até o final da terceira década de vida, sendo mais comum em pessoas com histórico familiar da doença ou em quem coça os olhos com frequência.
Quais os principais avanços no diagnóstico e nas opções de tratamento?
Os últimos anos trouxeram avanços impressionantes no diagnóstico do ceratocone. Hoje, utilizamos equipamentos de tomografia e topografia de alta resolução da córnea, capazes de detectar alterações micrométricas antes mesmo dos sintomas surgirem.
Esses exames — como Pentacam, Galilei, Sirius e TMS — analisam não só a curvatura, mas também a espessura e a elevação posterior da córnea, permitindo o diagnóstico precoce e o acompanhamento preciso da evolução.
No tratamento, as opções se expandiram consideravelmente:
1. Óculos e lentes de contato especiais: nos estágios iniciais, lentes rígidas ou híbridas proporcionam boa qualidade visual.
2. Crosslinking corneano (CXL): é o grande marco das últimas duas décadas. O procedimento fortalece as fibras de colágeno da córnea, estabilizando a doença e evitando sua progressão.
3. Anéis intracorneanos (ICRS): implantes finos de material acrílico que regularizam a superfície corneana, melhorando a visão e a simetria da córnea.
4. Transplante de córnea (DALK ou PK): reservado para casos avançados, quando há cicatrizes ou afinamento extremo. As técnicas modernas são menos invasivas e proporcionam recuperação visual mais rápida e segura.
5. Novas tecnologias: estão em desenvolvimento tratamentos personalizados com crosslinking acelerado, guiado por mapa tomográfico, e lentes de contato esclerais customizadas, que oferecem visão excepcional mesmo em córneas muito irregulares.
É possível prevenir ou retardar o ceratocone?
Ainda não há uma forma de prevenir completamente o ceratocone, mas há sim maneiras eficazes de evitar sua progressão. O principal fator modificável é o hábito de coçar os olhos. Essa prática, muitas vezes subestimada, pode agravar o afinamento e acelerar o avanço da doença.
Por isso, orientamos:
• Evitar coçar os olhos, especialmente com força ou frequência. Se houver coceira, procurar o oftalmologista para tratar alergias oculares.
• Consultar regularmente o oftalmologista, principalmente se houver histórico familiar de ceratocone.
• Realizar exames de topografia e tomografia da córnea em adolescentes e jovens com astigmatismo irregular ou progressivo.
• Proteger os olhos contra traumas e infecções, e manter uma boa lubrificação ocular.





